sábado, 20 de agosto de 2011

Dos filmes que eu vi: A Informante

A Informante é um filme Alemão/ Canadense de 2010 baseado em fato reais que trata de um mal ignorado nas guerras que é o tráfico de mulheres para a prostituição, escravidão e sevícia.

Na narrativa Kathy (Rachel Weisz) é uma policial ética e comprometida com seu trabalho que, por motivos financeiros, vai trabalhar como pacificadora da ONU na Bósnia, pós guerra. O que ela encontra lá é um pais arrasado tanto do ponto de vista da destruição material, quanto do ponto de vista moral. No desempenho de suas funções Kathy presencia abusos de toda ordem contra os direitos humanos da população feminina nativa civil, até se deparar com a máfia do tráfico de mulheres, oriundas de diferentes países, alguns da antiga União Soviética, transformadas em escravas sexuais, que sofrem todo tipo de violência.

O que assusta na narrativa do filme é o fato de que, ali, são  os agentes de segurança da ONU, com imunidade diplomática, que são, ao mesmo tempo, os chefões da rede de tráfico de mulheres e os frequentadores dos bares, bordéis, aonde as mulheres são mantidas em cárcere privado e submetidas a torturas e a todo tipo de sevícia.
Esse filme é uma denúncia contundente contra os conchavos políticos da ONU, que fecha os olhos para o que acontece para preservar a instituição. 

Outro fato grave que essa narrativa nos mostra é que os profissionais que se alistam nas forças de paz da ONU nem sempre os fazem por motivos humanitários e sim por motivos economicos, uma vez que o salário pago para os que participam dessas missões é bem alto. Pelo que mostra no filme qualquer psicopata pode se alistar e servir a ONU e cometer, acobertado pela imunidade diplomática, todo o tipo de atrocidades e abusos de poder.
O título original do filme é The Whistleblower, que é uma pessoa que torna público atividades ilegais ou uma conduta desonesta, que vem sendo praticada em um departamento do governo, ou em uma organização pública ou privada, ou mesmo em uma empresa. 
 Para nosso espanto na narrativa do filme a corda arrebenta para o lado de Kathy. Ao desbaratar a quadrilha e denunciar ao representante máximo da ONU na Bósnia, é ela quem perde o trabalho e é expulsa da força de paz. 
Esse filme retrata bem o que o Dr. Freud nos disse quando afirmou que é o recalque das pulsões sexuais e agressivas que funda a civilização. Quando desrecalcamos uma dessas duas pulsões a outra é desrecalcada ao mesmo tempo e  tudo passa a ser permitido. O que passa a vigorar a partir de então é a barbárie.  O ser humano, nesses casos, perde sua humanidade e se transforma em uma besta.

sábado, 6 de agosto de 2011

Dos filmes que eu vi: Em um Mundo Melhor

A diretora Susanne Bier, a meu ver, acertou em cheio ao problematizar a complexidade dos seres humanos no filme dinamarquês "Em um Mundo Melhor".
 Nesse filme ela trata de questões que nos angustiam e para as quais não temos respostas: 
- A morte, por exemplo.  A narrativa do filme aborda essa questão sobre três aspectos: 
1. A revolta ou a raiva  que advém da não elaboração do trabalho de luto. O trabalho de luto é um trabalho psíquico necessário para a elaboração de perdas de pessoas queridas. 
2. Como a morte de uma pessoa querida tira o "véu" que nos defende do fato de sermos mortais e nos revela a possibilidade, insuportável, da morte. E que quando o trabalho de luto é concluído e retomamos a vida normal o véu volta a encobrir  a morte. 
Só deixando a morte em paz podemos apostar na vida.
3.  O significado da morte e um enterro em Londres ou na Dinamarca e em um campo de refugiados na África.

Destaco ainda outros temas que considero relevantes e que fazem parte da história narrada no filme:
- A separação dos pais e o rebatimento dessa situação na vida do filho mais velho.
- A ausência física do pai, que se divide, por força de seu trabalho, entre a Dinamarca e a África.
- A violência humana, presente em qualquer parte do mundo: na desenvolvida Dinamarca e no campo de refugiados africanos.
- Quanto maior o nível de violência, que em alguns países da África é a barbárie, mais vitimiza  a mulher.
- O preconceito existente entre povos de diferentes países.
- A lei da prisão que vigora na escola: o aluno novo que chega tem que enfrentar o chefe da gang para ser deixado em paz. 
- A dificuldade dos gestores da escola de perceberem o que acontece ali, embaixo de seu nariz, e de colocar limite no garoto que dominava os demais.
- O pai bonzinho demais que fica desvalorizado na frente do filho e de seu amigo.

A narrativa do filme mostra ainda que não dá para o ser humano ser neutro frente às situações de violência e de opressão que ele vivencia ou assiste em seu cotidiano sob a pena de não contribuir para um mundo melhor.
O filme demonstra também que é mitológica essa verdade cristã que diz que se alguém te espanca você deve dar a outra face.  Se você der a outra face ele baterá de novo. Os seres humanos pedem limite. É o limite, sob a forma da Lei Social, associado ao afeto, que barra a violência. 
Em um Mundo Melhor me fez lembrar de  Guimarães Rosa que diz pela boca de Riobaldo "que viver é perigoso". Viver é mesmo perigoso. Seja na barbárie de alguns países africanos, seja na super desenvolvida Dinamarca.
Adorei esse filme! A história nos tira de nosso habitual conforto e nos convida a olhar para além de nosso próprio umbigo.
 
PS: Confesso que precisei  usar todos os lenços de papel que tinha na bolsa!

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Pegando carona na beleza do texto deClarice

"..existe a trajetória,
e a trajetória não é apenas um modo de ir.
A trajetória somos nós mesmos.
Em matéria de viver,
nunca se pode chegar antes."
Clarice Lispector