A adolescência não é um período muito tranquilo na relação entre pais e filhos. Crescer e se separar de seus pais é uma tarefa difícil e que não ocorre sem conflitos de ambos os lados. Os filhos precisam crescer e se afirmarem como diferentes de seus pais. Os pais teem sempre uma certa dificuldade de perceber que seus filhos estão crescendo e que já não precisam deles como precisavam na infância. Os filhos, por sua vez, ora se comportam como crianças, ora dão mostras de estarem amadurecendo. Os pais também oscilam e tratam seus filhos ora como crianças e ora como adultos.
Nessa busca por novas identificações fora de casa o adolescente tende a questionar os valores recebidos e a rebelar frente as decisões de seus pais, quando eles não atendem as suas demandas e dizem não a alguns de seus pedidos. Os pais por seu lado reatualizam os conflitos que vivenciaram em sua própia adolescência.
Foi em plena adolescência de minha filha que descobri, por acaso, o Zéquinha. Ele era baiano, lá de Arraial d`Ajuda e foi amor a primeira vista. O moço que o vendia chamava o boneco de ME LEVA e era ótimo no manuseio do mesmo.
Ao chegar em casa com o Zéquinha, que foi o nome que demos ao boneco, minha filha também começou a brincar com ele. A partir de então sempre que eu precisava dar alguma ordem para ela, mandando arrumar seu quarto, por exemplo, ou tratar de algum assunto que poderia ser fonte geradora de discussão era através do Zéquinha que eu falava com ela. Essa foi uma boa forma que encontrei para as possíveis situações, que sem a mediação do Zéquinha, com certeza seriam conflituosas.
Assim alguns assuntos desgastantes se tornaram risíveis tendo o Zéquinha como porta voz. Ele era engraçado, desengonçado e beijoqueiro ao mesmo tempo. Ele era uma graçinha e sendo assim tão sedutor era difícil minha filha não atender a um pedido dele.
De tanto utilizarmos o boneco ele morreu, quero dizer ele rasgou. Nunca mais consegui outro igual.
Maria, a boneca da foto, é muito parecida com o Zéquinha, só que é menina. Parece até irmã gêmea dele. Maria foi comprada depois, em outra época de nossas vidas.
Comprei a Maria com a desculpa de levá-la para o meu consultório, onde atendo algumas crianças. Mas confesso que não ia gostar se uma criança rasgasse a Maria. Assim ela está guardada aqui em casa esperando a chegada de um netinho, quem sabe?
Até hoje o Zéquinha é uma boa lembrança em nossa história.
Zéquinha foi um terceiro que facilitou muito minha comunicação com minha filha nos tempos áureos de sua adolescência.
Com o Zéquinha liberei um pouco de fantasia para lidar com situações do cotidiano que, tratadas de outra forma, podiam gerar uma guerra familiar desnecessária.Tais situações, na maioria das vezes, são mesquinhas, pequenas e ridículas e devem ser relevadas em favor da manutenção de uma relação afetiva entre os pais e os filhos e entre os irmãos. Claro que nem sempre conseguimos relevar essas bobagens.
O Zéquinha me ajudou muito como mãe. Ele era uma espécie de Carlito desajeitado que eu incorporava quando manuseava o boneco. Manuseando o Zéquinha, eu que dizem que tenho cara de brava e que sou brava em algumas situações, me tornava engraçada e podia tratar de algumas questões com muito mais leveza.
Talvez conservando a Maria mantenho acesa a possibilidade de a qualquer momento reincorporar o Zéquinha.