quarta-feira, 29 de setembro de 2010

A sabedoria infantil

Em uma de suas vindas à nossa casa minha afilhada, de seis anos, falou sobre o livro de histórias chamada "Planeta Sim". Ela explicou que nesse planeta só se pode dizer sim.
E continuou dizendo:
- Imagina se meu irmão falar com a mamãe: posso matar a Janaína? Ela teria que responder sim!
- Posso quebrar os brinquedos da Janaína? Ela teria que responder sim!
- Posso jogar os brinquedos de Janaína pela janela? Ela teria que responder sim!
Sem interromper sua narrativa ela finalizou com toda a carga dramática que uma criança muito expressiva e viva de seis anos pode ter: esse é o pior dos planetas!
Vou sugerir a alguns pais que escutem o conselho da Jana.
Digam não aos seus filhos! Eles precisam de saber que não podem ter, nem fazer tudo o que desejam, pensam ou sonham.
Sempre fico me perguntando se uns 90% das crianças com diagnóstico de hiperatividade não são crianças cujos pais são muitos permissivos e não as educam. Não dizem não. Não colocam limites. Não ensinam para elas o que é certo ou o que é errado.
Criança não nasce sabendo, tem que aprender tudo. Tem que ser educada. Ensinar, educar dá um trabalho danado. Tem que repetir a mesma coisa milhões de vezes. É bastante cansativo e, absolutamente, necessário para a saúde mental da criança e do adulto que ela irá se tornar e para o bem da coletividade na qual a criança está inserida.
Até para a criança viver só no planeta sim é insuportável! É saber que seus pais não a educam por não se importarem com ela.
Educar é sempre uma aposta amorosa no outro. A criança necessita se sentir amada. Só para não perder o amor de seus pais e parentes que ela suporta sofrer os efeitos da educação, tão necessária para sua saúde mental e sua vida futura. Só para não perder esse amor ela aceita as regras e os limites que o processo educativo pressupõe.
PS: não conheço o livro ao qual Jana se referiu. Procurei na internet para citar o autor e não encontrei.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Caminhante

Foto do convento da Penha- Vitória ES
A vida tem lá seus dias nublados, que nem sempre condizem com nosso espírito ou com as estações do ano.

A prima vera chegou e eu , que não tenho nenhuma prima com esse nome, desconfio que só os moradores dos países frios tenham tal prima que é tão esperada pois chega e os livra dos dias nublados de Bélgica. Essa expressão aprendi com uma conhecida que morou na Bélgica. Ao voltar a morar no Brasil ela sempre se referia assim quando o dia amanhecia chuvoso e cinzento.

E por falar em tempo o clima anda tão maluco que temos um inverno em pleno Setembro. As castanheiras, coitadas, já ficaram sem folhas muitas vezes. Nem bem as folhas reaparecem em sua copa, esfria um pouquinho e elas, despudoradamente, já ficam peladas de novo.

Mas quem nesse mundo maluco quer reparar nas castanheiras?

Quando vamos começar a viajar em nossa própria cidade? No dia a dia, geralmente, não nos sobra tempo para observarmos as tartarugas que aparecem na curva da Jurema, a lua cheia reluzindo no mar e os ipês floridos, as castanheiras que nos dão uma sombra tão generosa e tantas outras belezas fortuitas que nossa ilha, que é bem bonita, nos oferece.

Em nosso cotidiano não vamos aos museus, nem visitamos os lugares bonitos que estão ali a nossa disposição a qualquer momento e sem nenhum custo. Só quando estamos viajando temos tempo de valorizar e apreciar a beleza de outras cidades.

Eu já comecei a viajar na minha cidade e estou achando ótimo. Viajo de caiaque, a pé, de bicicleta, de carro e de ônibus. Fazendo o mesmo percurso descubro sempre outras belezas. Não seria esse viajar uma metáfora da vida? Não é a vida uma viagem na qual fazemos e refazemos um mesmo caminho?

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Cachoeiro e Paris

Por ser considerada a capital secreta do mundo, como é conhecida minha cidade natal, pelo bairrismo exagerado dos Cachoeirenses, Cachoeiro gera muitas gozações entre aqueles que não nasceram lá.
Um primo gozador, disse para Roberto, que também adora gozar minha cidade natal que, segundo Júlio Fabris, Cachoeiro se parece com Paris.
Júlio deve ser irmão de Sônia Izabel, minha colega do Colégio Cristo Rei e de Celeste, que deu aula na escola Pica Pau, aqui em Vitória, aonde meus filhos estudaram.
E passou a descrever as semelhanças:
- Paris tem um rio que corta a cidade. Cachoeiro também.
- Paris tem um calçadão que margeia o Rio. Cachoeiro também.
- Paris tem uma igrejinha famosa. Cachoeiro também.
E como bem lembrou minha irmã Beatriz Paris tem a Ile de la Cité. Cachoeiro tem a Ilha da Luz.
Essas semelhanças me convenceram.
Venho portanto sugerir aos membros do consulado de Cachoeiro, aqueles simpáticos senhores que ficam sentados nos dois banco da curva da Jurema, a mediarem uma negociação entre a prefeitura de Paris e a de Cachoeiro. O objetivo dessa negociação é a assinatura de um pacto entre as duas cidades como cidades irmãs.
Meu primo se esqueceu de citar a principal semelhança entre as duas cidades. Estou me referindo à elegância da mulher cachoeirense. Acho que esse esquecimento foi proposital para não causar encrenca com sua mulher que é carioca.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A censura mora ao lado

Tentava inventar uma história. Dessas risíveis. A filha chega e lê o que está sendo escrito e censura. A mãe muda o tema e resolve falar sobre a censura como fruto da ditadura. Aos olhos da filha o tema é o mesmo. Diz que a mãe quer implicar com ela. A mãe não se rende. Demorou um tempo enorme para se permitir escrever, sem achar ou pensar no que irão dizer ou julgar. Demorou muito tempo para suspender a censura interna. Ela que viveu a ditadura militar não pode se render a ditadura domiciliar. Rindo citou jargões sobre a liberdade, que já é tão pouca, e sobre o direito de inventar qualquer história louca que a permita fingir e mentir. De vez em quando uma mentira e um fingimento faz um bem danado. Afinal toda história tem um pouco de memória e muito de ficção. Por isso toda vida, quando bem vivida, dá boas histórias. Basta ter alguém que conte e alguém que escute. Só escuta quando se entende a língua. Assim a história vai criando pernas e ganhando o mundo. Vários mundos existem em um só e tudo vai girando. Ela, que mora numa ilha, pensa aliviada que o fantástico de tudo isso é que o mar não entorna.
PS: A foto acima é da ilha de Vitória, que achei na internet.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Andando nas nuvens

Hoje voltando do podologo onde fui tirar cravos e calos me senti andando nas nuvens.
Quando eu fazia faculdade meu amigo, Fabiano, me chamava de Ângela Passarinho. Ele me achava muito desligada.
Faz tempo que não tenho notícias desse amigo. Se ele me visse hoje, com certeza, iria reafirmar seu dito, ainda que a henna seja usada para tingir de vermelho meus cabelos brancos.

Chiques chiliques

Encontrei essa tarde uma conhecida de minha terra natal. Conversando fiquei sabendo notícias de uma outra conterrânea, que era minha amiga de infância.
Soube que ela agregou o apelido ao seu registro civil e que não gosta que a chamem pelo seu nome. Interessante é que na infância só seus familiares podiam chamá-la pelo apelido. Todos nós mortais a chamávamos pelo nome.
Hoje o apelido virou marca de sua empresa e ela só se reconhece por ele.
Conhecer, se reconhecer e ser reconhecida é sempre uma questão para o ser humano consigo mesmo e com os relacionamentos que ele estabelece. O nome é a marca distintiva do sujeito. Fica difícil tendo chamado sempre uma pessoa por um nome mudar assim de repente por questões de mercado. Parece se tratar de outra pessoa. Acho que efetivamente é disso que se trata.
Porque é difícil suportar ser chamada pelo nome que era conhecida por seus amigos de infância? Essa questão só a fulana poderá responder, se ela quiser, é claro!
Mudar o nome não é suficiente para mudar o lugar que o sujeito se coloca na relação com o outro. Lograr uma mudança desse porte implica em uma reviravolta que não é tão simples nem fácil de se dar. Via de regra é num processo bem sucedido de análise que tal mudança ocorre. E esse caminho só o sujeito pode desejar percorrer. Esse percurso implica no reconhecimento de algumas perdas que são inerentes à nossa condição humana.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Gozo mortal

Um ódio visceral era o sentimento visível na relação entre a filha e sua mãe.
Não dava nem para disfarçar. A filha não falava. Vomitava ódio. Desses avassaladores. Seu vomito, como um tsunami, varria toda a possibilidade de vida ao redor daquela cena grotesca. Pura pulsão de morte. A filha precisava daquele ódio para viver. A mãe, em sua culpa, permitia tudo.
A filha com suas demandas e acusações infinitas saiu de cena. Saiu pequena. Já adulta teima em não crescer. Age como uma pessoa que não conhece a Lei. Não respeita seu pai ou sua mãe. Não respeita nem a si mesma. E sofre. O rosto se contorce de gozo e sofrimento.
Como pode uma relação entre mãe e filha chegar a tal ponto?